Arquivos Mensais: dezembro \15\America/Sao_Paulo 2014

Ponto de partida para discussão do currículo do ensino médio – documentação existente

A definição de uma base curricular nacional, em especial a do ensino médio, será um tema recorrente no próximo ano. Quais são os documentos que embasam a discussão? Qual o ponto de partida?

O currículo da educação básica no Brasil tem 3 fundamentos: legal, técnico e das matrizes de avaliação do ENEM. O fundamento legal é dado pelos seguintes documentos:

Constituição Federal, em seu artigo 210, cumpre com o objetivo de estabelecer um princípio de equidade ao dizer que “Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum” e pela

Lei de Diretrizes e Bases da Educação conhecida como LDB, em sua versão mais atual de 1996, que tem sido alvo de ataques de grupos organizados que vão inserindo penduricalhos à lei, sem levar em conta a hierarquia de prioridades que o tempo escolar escasso enseja. Em seus artigos 26 e 27 estabelece:

Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos.   (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)

1º Os currículos a que se refere o caput devem abranger, obrigatoriamente, o estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente do Brasil.

3º A educação física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da educação básica, sendo sua prática facultativa ao aluno:(Redação dada pela Lei nº 10.793, de 1º.12.2003)

4º O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e européia.

5º Na parte diversificada do currículo será incluído, obrigatoriamente, a partir da quinta série, o ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna, cuja escolha ficará a cargo da comunidade escolar, dentro das possibilidades da instituição.

6o A música deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular de que trata o § 2deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.769, de 2008)

7o Os currículos do ensino fundamental e médio devem incluir os princípios da proteção e defesa civil e a educação ambiental de forma integrada aos conteúdos obrigatórios.    (Incluído pela Lei nº 12.608, de 2012)

8º A exibição de filmes de produção nacional constituirá componente curricular complementar integrado à proposta pedagógica da escola, sendo a sua exibição obrigatória por, no mínimo, 2 (duas) horas mensais.(Incluído pela Lei nº 13.006, de 2014)

9Conteúdos relativos aos direitos humanos e à prevenção de todas as formas de violência contra a criança e o adolescente serão incluídos, como temas transversais, nos currículos escolares de que trata ocaput deste artigo, tendo como diretriz a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), observada a produção e distribuição de material didático adequado. (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014)

Art. 26-A.  Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. (Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).

  • 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.(Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).
  • 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras.(Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).

Art. 27. Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as seguintes diretrizes:

I – a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática;

II – consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada estabelecimento;

III – orientação para o trabalho;

IV – promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não-formais.

O componente técnico é dado pelo Ministério da Educação e pelo Conselho Nacional da Educação, detalhando na Resolução Nº 2, de 30 de Janeiro 2012, que define Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio e por toda documentação detalhada oficial fornecida quer pelo MEC, em nível federal, quer pelas secretarias de educação de estados e municípios. Os artigos 9º e 10º da Resolução nº 2 resumem os conteúdos obrigatórios:

Art. 9º A legislação nacional determina componentes obrigatórios que devem ser tratados em uma ou mais das áreas de conhecimento para compor o currículo:

Parágrafo único. Em termos operacionais, os componentes curriculares obrigatórios
decorrentes da LDB que integram as áreas de conhecimento são os referentes a:
I – Linguagens:
a) Língua Portuguesa;
b) Língua Materna, para populações indígenas;
c) Língua Estrangeira moderna;
d) Arte, em suas diferentes linguagens: cênicas, plásticas e, obrigatoriamente, a
musical;
e) Educação Física.
II – Matemática.
III – Ciências da Natureza:
a) Biologia;
b) Física;
c) Química.
IV – Ciências Humanas:
a) História;
b) Geografia;
c) Filosofia;
d) Sociologia

Art. 10. Em decorrência de legislação específica, são obrigatórios:
I – Língua Espanhola, de oferta obrigatória pelas unidades escolares, embora facultativa para o estudante (Lei nº 11.161/2005);
II – Com tratamento transversal e integradamente, permeando todo o currículo, no âmbito dos demais componentes curriculares:

  • educação alimentar e nutricional (Lei nº 11.947/2009, que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da Educação
    Básica);
  • processo de envelhecimento, respeito e valorização do idoso, de forma a eliminar o preconceito e a produzir conhecimentos sobre a matéria (Lei nº 10.741/2003, que dispõe sobre
    o Estatuto do Idoso);
  • Educação Ambiental (Lei nº 9.795/99, que dispõe sobre a Política Nacional de Educação Ambiental);
  • Educação para o Trânsito (Lei nº 9.503/97, que institui o Código de Trânsito Brasileiro);
  • Educação em Direitos Humanos (Decreto nº 7.037/2009, que institui o Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH 3).

Dos 3 componentes, o único que tem mais força no sentido que fazer todo o sistema educacional andar na direção de garantir conteúdos mínimos e, em alguma medida, equitativos, são as matrizes curriculares do ENEM. Isso acontece porque cada vez mais alunos saem do ensino médio querendo seguir para o ensino superior e têm que passar pelas provas do ENEM. Assim, se veem obrigados a aprender o conteúdo que cai na prova. As matrizes curriculares do ENEM também não são nada claras, mas aqui e ali se encontram parâmetros de onde se pode selecionar, de forma objetiva, conteúdos a serem ensinados aos alunos das escolas públicas. Nas escolas privadas, principalmente nas de elite, existe uma tradição do ensino de determinados conteúdos, como literatura e geometria, por exemplo. As famílias fazem pressão para que seus filhos se saiam bem nas provas para as universidades, mas também proporcionam atividades culturais e educativas a seus filhos, que complementam o que a escola deixa de ensinar. Vamos a 4 exemplos das habilidades previstas para o ENEM, dois de português e dois de matemática:

H15 – Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.

H23 – Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.

H20 – Interpretar gráfico cartesiano que represente relações entre grandezas.

H27 – Calcular medidas de tendência central ou de dispersão (ou seja, calcular média e desvio padrão) de um conjunto de dados expressos em uma tabela de freqüências de dados agrupados (não em classes) ou em gráficos.

Existe ainda um documento no site do MEC denominado Orientações Curriculares para o Ensino Médio, em três volumes e datado de 2006, que explica o que os alunos devem aprender no ensino médio. É um documento confuso, cheio de cacos ideológicos, que também não ajuda a um professor, coordenador pedagógico ou diretor de escola pública a selecionar conteúdos para seus alunos. Recomendo fortemente a leitura dos documentos completos, cujos links estão abaixo:

2006 – Orientações Curriculares para o Ensino Médio – preparadas pelo MEC

Volume 1 – Linguagem, Artes, Ed. Física:

Clique para acessar o book_volume_01_internet.pdf

Volume 2  – Ciências da Natureza e Matemática:

Clique para acessar o book_volume_02_internet.pdf

Volume 3: Ciências Humanas e suas Tecnologias

Clique para acessar o book_volume_03_internet.pdf

2010: Diretrizes Curriculares para a Ed. Básica e EF de 9 anos

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=14906&Itemid=866

2012: RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 2, DE 30 DE JANEIRO 2012 Define Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=17417&Itemid=866

 

 

 

 

 

 

Preguiça mental + oportunismo político + ignorância = não colheremos nada de novo na educação

Entrevista concedida ao Programa Matéria de Capa da TV Cultura e que foi ao ar em 30/12/2014.

A respeito do relatório das Nações Humanas sobre a população mundial, que mostra a população jovem no seu pico. Falar em crianças e jovens é falar, principalmente, de educação. Mas no Brasil, apesar de sermos um país ainda majoritariamente jovem, não conseguimos acelerar a efetividade dos serviços educacionais. Uma mistura de preguiça mental com oportunismo político e ignorância. Difícil nos libertarmos dessa armadilha sem olhar para países desenvolvidos (democracias consolidadas e industrializadas) e ver o que eles estão fazendo, pelo menos para achar um ponto de partida mais avançado.

Jabuticaba é uma delícia. Só dá aqui. Mas achar que as políticas educacionais só podem nascer de sementes brasileiras e em solo brasileiro, é se resignar com uma educação de péssima qualidade e excludente que já conhecemos. Um pouquinho de coragem e poderemos colher novos e saborosos frutos!