Arquivos Mensais: agosto \20\America/Sao_Paulo 2019

Itiuorquedi x magia negra da Estatística, uma fábula de suspense

Em um tempo longínquo, existiam dois reinos separados por muitas e muitas léguas um do outro. Um era verdejante, pequenino e próspero, cercado por outros reinos cheios de riquezas minerais, onde seus felizes súditos podiam trabalhar e até estudar. Seus habitantes tinham tanta sorte, que contavam até com uma grande lagoa mágica, da qual emanava vida e sabedoria.

O outro era árido, grande e pobre, além de isolado e bem no meio de um deserto. Água, ali, só com muita reza ou mágica. Até o rio que passava pelo reino era danado: praticamente secava no verão e inundava as ruas no inverno. Os reinos vizinhos eram igualmente pobres e desolados.

No reino pequeno, arborizado e abençoado, morava uma Maga muito querida, dotada de poderes mágicos que faziam todas as crianças aprenderem a ler e a escrever de forma misteriosa! Ela era a pessoa mais famosa daquele lugarzinho. Todos ali tinham muito orgulho dela e achavam o máximo ter o privilégio de tê-la como referência. Ler, mesmo, livros e textos longos e complicados, assim como escrevê-los, a maior parte das crianças do reino pujante não conseguia bem não. Mas como tudo no pedaço era muito lindo e harmônico, ninguém reclamava. Além disso, fotos e vídeos coloridos e animados garantiam que tudo corria bem nas escolas reais.

Já no reino grande, onde a vida era muito mais dura, com muita poeira e calor e sem lagoa mágica, os professores tinham que estudar e trabalhar muito para poder ensinar as crianças a ler e a escrever. Dizem que é porque os vídeos e as fotos que revelam alfabetização demoraram muito para chegar naquele lugar atrasado e, por causa disso, professores e alunos tinham que aprender na marra: com lápis, papel, livros e muito beábá, que era a palavra mágica que o malvado e ranzinza bruxo local mais sabia pronunciar.

A história que corre é que, ali, as crianças tinham sido encantadas por uns coronéis malvados e não aprendiam a ler e a escrever de jeito nenhum – um quadro desolador -. Só que um dia, apareceu um rei que achou aquilo muito feio e encasquetou que ia quebrar esse feitiço desumano. Como ele nunca tinha ouvido falar na Maga Alfabetizadora, mandou buscar em um reino próximo um bruxo muito bravo, que garantia que era capaz de reverter aquele sortilégio. Ele usava umas expressões muito esquisitas quando estava desencantando as crianças, soltava uns palavrões quando ouvia falar de bruxas da escola do itiuorquédi (ver temporada 1) porque, como era ignorante, não conhecia a fama da tal alfabetização para fotos e vídeos e, pasmem, botava os meninos para praticar ler e a escrever as coisas que as pessoas falam. Era de uma excentricidade que deixava muita gente nervosa. Ele também achava que as escolas deveriam ter livros e dicionários, como se os pequenos súditos fossem gente grande. Como o rei e toda a corte não tinham mais ninguém para lhes aconselhar, tiveram que ficar com essas soluções esdrúxulas mesmo.

Além de todas as maluquices, o feiticeiro tinha um problema muito sério: ele acreditava em um tipo de feitiçaria raríssimo, que poucos iniciados ousavam praticar – a Estatística – . Era um horror, testes e mais testes, com todas as crianças falando o que liam em microfones, alunos escrevendo noite e dia no papel…fotos e vídeos que é bom mesmo, nada! Tinha gente que previa que aquilo não ia dar certo, que as crianças iam perder a sua identidade brincalhona e iam começar a cuspir porcas e parafusos quando o feitiço da Estatística realmente se instalasse e elas virassem robozinhos.

O fato é que muitos e muitos e muitos anos nessa maluquice de achar que criança pode ler e escrever como adulto não poderia dar certo mesmo. Finalmente, chegou ao reino esquisito do deserto um verdadeiro exército de pessoas armadas com câmeras modernas para fazer vídeos com pirralhos reais relatando sonhos vagos ou registrar singelas fotos de sorrisos. Agora, finalmente, os alunos pobres daquele desgraçado local seriam curados da praga das provas e registros estatísticos, que é bem mais poderosa, apesar de ser classificada pelas bruxas do bem como Magia Negra. Não se sabe ainda o que vai ser deles, mas a feitiçaria do bem – que é sempre coisa de gente muito otimista – com certeza vai triunfar, porque suas poderosas palavras mágicas, “itiuorquédi e detixersrilililaiquedi” vão fazer efeito em breve.

Itiuorquédi – uma fábula sobre o combate ao analfabetismo escolar

Era uma vez um reino distante e vasto, com um poderoso mandatário. Ele tinha uma filha querida que era professora e que precisava de uma mãozinha para para seus projetos de educação. Como ele era muito poderoso, os chefes de guildas produtivas não tardaram a contribuir com a valorosa iniciativa real. No auge de sua fama, rapidamente conquistada por meio dos resultados de programas educativos que ajudaram o reino longínquo e imaginário a se livrar da praga do analfabetismo escolar (e absolutamente não pelas verbas publicitárias das tais guildas), a princesinha benemerente declarou para especialistas estrangeiros, de que forma ela se certificava de que suas intervenções eram eficazes: itiuorquédi, detixersrilililaiquedi. Essas eram as palavras mágicas que revelavam, em inglês, o segredo da causalidade que justificava a existência de programas aleatórios para resolver o problema sistemático do analfabetismo escolar do tal reino.

Mas havia um probleminha. O feitiço não funcionava quando as crianças faziam provas. A alfabetização aparecia apenas em fotos em que elas estavam sorrindo e mostrando desenhos, ou em vídeos em que contavam seus sonhos para o futuro. Era muito esquisito, mas quando tinham que ler e escrever textos, o feitiço se quebrava e elas voltavam a ser analfabetas.

As amigas da princesinha não se importavam com isso, o que contava é que as palavras mágicas “itiuorquédi e detixersrilililaiquedi” quando faladas, com convicção – em qualquer idioma – , eram muito poderosas: faziam qualquer pessoa de bom coração ver crianças alfabetizadas e felizes.

Só que algumas crianças, as que não apareciam em fotos ou vídeos de programas educacionais vagos, aprendiam realmente a ler e conseguiam fazer provas com sucesso. É verdade que elas eram bem poucas, mas, mesmo assim, a existência delas fazia com que muita gente, em muitos reinos diferentes, acreditasse que o feitiço de alfabetização era realmente poderoso e permanente.

A explicação para isso é que a bruxa boa que desenhou o feitiço para fazer ações desconexas e desconectadas de “alfabetização” ensinarem alunos a ler e a escrever era meio biruta. O tal encantamento alfabetizatiço que ela inventou só funcionava quando mães, fonoaudiólogas, psicopedagogas e explicadoras em geral, usavam métodos secretos para ensinar alunos a ler a ponto de entender textos mais longos e a escrever idem. Esses métodos secretos eram realmente desconhecidos da maioria das pessoas. E ninguém gostava de falar neles, por que tinham sido atribuídos a povos formados por gente muito má, que costumava habitar lugares mais frios, nos quais se usava uma ciência obscura para avaliar intervenções, cujo nome as bruxinhas boas não podiam pronunciar, sob pena de imediatamente serem transformadas em pó – a Estatística.

A verdade é que a bondosa princesa fazia parte de uma famosa escola de bruxinhas fofas, mega engajadas no combate mundial ao analfabetismo escolar. Elas eram muito poderosas e gostavam de morar em reinos com clima quente e úmido de um planeta plano imaginário, no qual a tal da ciência não pronunciável, a Estatística, não tinha muita vez. As ilustrações da época mostram que elas podiam ser facilmente reconhecidas porque usavam roupas largas, que enfeitavam com colares feitos de sementes mágicas e coloridas. Elas falavam uma língua cheia de códigos que só elas entendiam, para que seu segredo da alfabetização mágica – a que não pode ser revelada por provas, mas que aparece em fotos e vídeos – nunca fosse revelado.

Esta primeira temporada da fábula itiuorquédi termina aqui. Aguardem as próximas, nas quais, possivelmente, a fórmula mágica da alfabetização que só aparece em fotos e vídeos, talvez seja finalmente trazida à luz.