A Pátria Educadora e o novo Ministro da Educação: grandes desafios de gestão e um filósofo

Para montar um quadro de expectativas para a gestão do novo ministro vou usar 3 parâmetros:

  1. Tentar adivinhar o que seja a Patria Educadora, pois o slogan deveria traduzir uma premissa de programa de governo ao qual os ministérios têm de se adequar,
  2. Se Pátria Educadora é cumprir o Plano Nacional de Educação (PNE), podemos esperar para a educação até 2018 um choque de gastos, mas não um choque de qualidade
  3. A experiência e a produção acadêmica/jornalística do Prof. Janine Ribeiro sobre educação, comparada com uma expectativa de que um ministro deveria ir além dos parâmetros estabelecidos no PNE

Em relação ao item 1):

Para saber sobre o que embasa o slogan “Pátria Educadora”, só lendo o programa de governo da Presidente Dilma, pois até agora não houve a apresentação de nenhum outro plano que o substitua. O plano de governo é uma documentação obrigatória de toda campanha eleitoral para presidente. O programa da Presidente Dilma foi chamado de “Mais Mudanças, Mais Futuro” e diz o seguinte:

“Estamos lançando um novo ciclo histórico de prosperidade, oportunidades e de mudanças.” pg 26

Sobre educação, a partir da pg. 29 o programa apresenta, resumidamente (o texto completo está no final do post), o seguinte:

– estarão gradativamente disponíveis para a Educação 75% dos royalties do petróleo e 50% dos excedentes em óleo do pré-sal,

– universalizar a educação infantil de 4 a 5 anos até 2016,

– ampliar e qualificar a rede de educação em tempo integral, de forma que ela atinja até 20% da rede pública, até 2018,

– com o PRONATEC, garantir a formação plena da juventude brasileira, por meio de um Pacto Nacional pela Melhoria de Qualidade do Ensino Médio, até 2016,

– conceder, no período 2015-2018, mais 100 mil bolsas do Ciência sem Fronteiras.

Em relação ao ponto 2)

As referências de qualidade do PNE são:

– alfabetizar as crianças até os 8 anos

– subir o ideb para 6,0 no primário, 5,5 no ginásio e 5,2 no ensino médio

– subir a nota média do Pisa para 473

Como já sabemos, o PNE apresenta um choque de gastos que conta com o dinheiro do pré-sal, sem o correspondente choque de qualidade, uma vez que os parâmetros escolhidos são muito baixos. Para explicar porque, detalho o resumo descritivo de cada nível de proficência do Pisa em Leitura.

Veja o que significa o valor 473 (nível 2) em leitura no Pisa (prova aplicada para uma amostra de alunos de 15/16 anos). Na edição do Pisa de 2012 tivemos 49% dos alunos que conseguiram fazer a prova (apenas 80% da coorte) ABAIXO deste nível. Efetivamente chegaram a este nível apenas 30% dos brasileiros, o que significa que eles conseguem:

“. . .  localizar uma ou mais informações, que podem precisar de inferências e de condições variadas. Outras requerem reconhecer a idéia central de um texto, compreender relações ou construir significados dentro de um fragmento limitado do texto quando a informação não é evidente e o leitor deve realizar pequenas inferências. Atividades nesse nível podem incluir comparações ou contrastes baseados em um único elemento do texto. Atividades típicas de reflexão neste nível exigem que os leitores realizem comparações ou várias conexões entre o texto e seus conhecimentos, obtidos pela experiência pessoal ou atitudes.”

Para chegar a 500 pontos, que segundo o MEC, seria (mas não é) equivalente ao valor 6 no Ideb, é preciso alcançar o nível 3, descrito abaixo. É importante compreender que o salto entre os dois níveis caracteriza uma significativa mudança de patamar de complexidade de leitura. Ao contrário do que se imagina, mudar do nível 2 para o 3 não significa acertar mais questões de mesma complexidade, mas acertar as questões de muito maior complexidade. Apenas 15,8% dos alunos brasileiros chegaram a esse nível. A média da OCDE é o dobro.

“Atividades neste nível requerem que o leitor localize e, em alguns casos, reconheça relações entre informações em diversos fragmentos que atendam a múltiplas condições. Atividades de Interpretação requerem que o leitor integre diversas partes de um texto visando identificar uma idéia central, compreender uma relação ou construir um significado de uma palavra ou frase. Devem ser consideradas diversas características em comparação, contraste ou categorização. Frequentemente as informações requeridas não são relevantes ou competem com diversas outras informações, podendo haver outros obstáculos no texto, cujas ideias são contrárias às expectativas ou redigidas de forma negativa. Atividades de reflexão podem requerer conexões, comparações ou explanações, ou podem solicitar que o leitor avalie uma característica do texto. Algumas atividades de reflexão requerem a fina compreensão do texto em relação ao conhecimento cotidiano e familiar. Outras atividades não requerem compreensão detalhada do texto, mas que o leitor considere um mínimo de conhecimento comum.”

Agora perceba o que significa, em leitura, o nível 6 (o mais alto do Pisa) que na escala começa com 698 pontos. A este nível nenhum brasileiro chegou em 2012.

“Atividades neste nível requerem que o leitor realize múltiplas inferências, comparações e contrastes com precisão e detalhamento. Elas requerem que se demonstre uma compreensão completa e detalhada de um ou mais textos que podem envolver integração de informação entre esses. Atividades que requerem que o leitor lide com idéias desconhecidas, na presença de informações concorrentes, e gere categorias abstratas de interpretação. As atividades de Refletir e Avaliar requerem que o leitor delineie hipóteses ou que avalie de forma crítica um texto complexo ou tópico desconhecido, levando em consideração múltiplos critérios e perspectivas, e aplicando interpretações sofisticadas para além do texto. Uma condição presente para exercícios de Acessar e Recuperar neste nível é a precisão de análise e atenção refinada para encontrar detalhes pouco perceptíveis nos textos.”

O item 3 é sobre a expectativa de que o novo Ministro vá além desses padrões.

O Prof. Janine Ribeiro é professor aposentado de filosofia da USP, onde ainda exerce algumas atividades acadêmicas. É muito respeitado na comunidade acadêmica, com um currículo bem abrangente. Sua experiência executiva na área de educação mais recente foi entre 2004-8 na Diretoria de Avaliação da Capes, que é o órgão do governo que “atua na formulação de políticas e desenvolvimento de atividades de suporte à formação de profissionais de magistério para a educação básica e superior”. O relatório de gestão de 2008, último ano em que o professor Janine esteve à frente da Diretoria (a partir da pg. 43), mostra uma evolução positiva das atividades sob sua responsabilidade.

Mas em um artigo do Valor de dezembro de 2014, o Professor Janine diz o seguinte:

“Qualquer um sabe responder quais são os principais ministérios do governo federal ­ aliás, de qualquer governo no mundo atual. São os da área econômica. Só que não. Os ministérios que definem o futuro de um país, que deverão ser decisivos nos próximos anos, e em poucas décadas serão reconhecidos como os principais, são três: Cultura, Atividade Física (como eu chamaria a atual pasta dos Esportes) e Meio Ambiente. [. . .] Cada vez mais, a educação deverá se culturalizar: um, deixando de seguir currículos rígidos; dois, tornando­-se prazerosa; três, criativa.”

Boa sorte, Ministro!

Abaixo o trecho completo do Programa de Governo 2015-18 da Presidente Dilma:

“O novo ciclo de desenvolvimento proposto para o segundo mandato da presidenta Dilma deverá ser lastreado pela Educação. Depois de um período prolongado de democratização do acesso a todos os níveis de ensino, inclusive o técnico e o universitário, chega-se agora à etapa de transformação da qualidade do ensino.

A proposta de investir fortemente na qualidade da Educação e, ao mesmo tempo, ampliar cada vez mais o acesso ao ensino, em todos os níveis – desde as necessárias creches até os cursos mais especializados–, manterá esse setor da vida pública como o responsável pelo êxito das metas de várias outras áreas da administração pública. Vai dar solidez à posição social dos brasileiros que subiram na escala social e estão hoje em posição melhor que a de origem. Continuará a dar chances de ascensão àqueles que ainda permanecem pobres e vai garantir mão de obra na quantidade e qualidade necessárias para sustentar o crescimento do país. Cada vez mais, deverá ser ampliada a produção da Ciência, da Tecnologia e da Inovação necessárias para que o Brasil ingresse efetivamente numa sociedade do conhecimento.

Para essa grande transformação na realidade educacional do Brasil, o governo tomou a iniciativa de destinar os recursos originários da exploração do petróleo, no pré e no pós-sal, para as ações nessa área. No novo governo de Dilma, estarão gradativamente disponíveis para a Educação 75% dos royalties do petróleo e 50% dos excedentes em óleo do pré-sal.

Somados ao orçamento da Educação, que teve considerável aumento em doze anos, os recursos provenientes da comercialização do petróleo oriundo do pré-sal vão tornar realidade o Plano Nacional de Educação (PNE), que o Governo Dilma aprovou sem vetos.

Vamos continuar ampliando o atendimento em creches para universalizar a educação infantil de 4 a 5 anos até 2016. Vamos continuar ampliando e qualificando a rede de educação em tempo integral, de forma que ela atinja até 20% da rede pública, até 2018. Vamos garantir, com o PRONA TEC, a formação plena da juventude brasileira, com acesso ao conhecimento científico e tecnológico, por meio de um Pacto Nacional pela Melhoria de Qualidade do Ensino Médio, até 2016. Vamos conceder, no período 2015-2018, mais 100 mil bolsas do Ciência sem Fronteiras.

Vamos fazer uma mudança curricular e na gestão das escolas. Vamos enfrentar o desafio de valorizar o professor, com melhores salários e melhor formação.

A política de mudança na qualidade do Emprego também terá forte apoio da educação. A criação de mais 12 milhões de vagas para cursos técnicos até 2015, na segunda fase do Pronatec-2, opera no sentido de qualificar trabalhadores.

Neste novo ciclo histórico, realizaremos as reformas fundamentais para que o nosso país se torne desenvolvido e mais justo. Reformas que só se tornaram possíveis depois desses 12 anos de crescimento econômico com distribuição de renda e inclusão social.”

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