No dia 4 de agosto último, a TV Globo exibiu um Globo Repórter sobre educação e superação, contanto casos de como pessoas com perfis absolutamente distintos descobriram para si um mar de possibilidades pessoais e profissionais por meio da educação, para responder à pergunta: até onde a educação pode nos levar?
Eu sempre impliquei com esse tipo de reportagem, que aborda políticas públicas por meio de personagens, porque reforça o caráter individualista da superação pela educação escolar. Esse tipo de herói, que sobrevive e vence sozinho as condições de absurda desigualdade e pobreza no nosso Brasil do séc. XXI, normaliza o “cada um por si”. O País deveria estar se organizando (ou melhor, já estar organizado) para tornar a superação inter-geracional dessas mazelas por meio da educação a regra, jamais a exceção.
Antes de seguir, não posso deixar de fazer um parênteses, pois a superação da D. Alezina e D. Therezinha, personagens idosas do Globo Repórter de sexta, que aprenderam a ler e descobriram seus talentos, começando uma nova vida depois dos 70, 80 anos, mostra que a educação é sim para todos. Todo mundo merece uma educação de qualidade, que, não esqueçamos, é um direito humano universal!
Mas, voltando à edição do Globo Repórter, cuja produção – Assimina Vlahou e Isabela Assumpção – está de parabéns, o viés fui justamente mostrar o desperdício de talentos e de capital humano pela falta da educação. E aí eles chegaram no único exemplo no Brasil que tornou a alfabetização de todos os alunos uma obsessão: Sobral. A partir da alfabetização, os alunos foram aprendendo cada vez mais e hoje a cidade apresenta o maior Ideb do Brasil nas duas etapas do ensino fundamental. TODAS as escolas de Sobral estão acima do esperado para a Prova Brasil. Infelizmente, por causa da cultura de mediocridade que nos assola, os indicadores nacionais exigem muito pouco dos alunos. Até isso agora Sobral vai inovar: a partir de um novo currículo de ensino fundamental (que meus leitores já conhecem) a nova obsessão vai ser alcançar seus pares em países desenvolvidos.
Mas a questão é que é só em Sobral. Minha tese de doutorado está estudando o caso. Já estou há 3 anos trabalhando em Sobral e estudando seus mecanismos de qualidade e não tem jeito: educação de qualidade é, antes de tudo, uma escolha política. Sem a escolha de enfrentar os interesses contrários, não se implementa nenhum programa, mesmo que já testado em outros lugares – muito menos por longos períodos no tempo. No discurso, todos são a favor de uma educação de alta qualidade. Mas na prática, quando a farinha é pouca, cada um garante seu pirão primeiro. Sindicatos não querem deixar que sejam criados parâmetros de aprendizado para os alunos ou de desempenho para os profissionais da educação. Empregadores de boa parte dos setores econômicos não querem abrir mão de mão-de-obra barata. Há famílias que não estão dispostas a fazer os sacrifícios ilustrados pela reportagem. E há muitos alunos que também sofrem de uma preguiça mental crônica, só que essa é justamente responsabilidade do sistema educacional resolver. Só acha que educação de qualidade é uma prioridade quem está exposto aos ambientes competitivos internacionais. Temos que concordar que é uma parcela mínima da população que realmente conhece o valor de uma educação competitiva e libertadores, mas que não tem, ou não quer usar, capital político.
A questão é que não há vontade política suficiente para resolver essa questão cara, trabalhosa, cujos benefícios não aparecem antes da próxima eleição. Se não damos conta de resolver com seriedade os problemas mais óbvios e urgentes com medo da conta de votos não fechar no próximo pleito, é claro que durante as próximas décadas não vai aparecer ninguém para vencer os interesses contrários aos do Matheus, André, D. Therezinha, personagens do Globo Repórter. Os políticos alinham-se a sindicatos e aos maiores empregadores, pois esses têm capilaridade para lhes conseguir votos, além de verbas para a campanha. Infelizmente, depois da minha tese estou entrando para o clube dos pessimistas. Só respiro otimismo quando vejo as luzinhas de Sobral na estrada da minha janela do Expresso Guanabara…
Respondendo ao Sérgio Chapelin: a educação brasileira vai nos levar até onde os políticos deixarem.
Sim! Sobral tem que mostar para o Brasil que não há intensão política da maioria dos governantes federais, estaduais e municipais em propor equidade e excelência para a educação. Sobral tem que mostar e gritar para o Brasil que é possível desenvolver uma educação para todos! Sobral tem que se agigantar com sua coragem, atitude e comprometimento, em desafiar os estigmas que assola a educação brasileira. Tem que expor para o Brasil suas conquistas! E se orgulhar de ser a melhor rede pública da educação brasileira! Educação pública de Sobral você me representa! E toda vez que me pegar pessimista diante da educação brasileira, terei seus exemplos para me reerguer e não cair no senso comum que a maioria dos próprios educadores brasileiros se encontram, o de se vitimizar diante da nossa realidade, sei que não é fácil, mas também sei que é possível!!
Tatiana!
Vejo que aí bate um coração sobralense…
😉
Muito orgulho!
Ilona mas um texto bem sensato, parabéns.
Eu sinceramente sinto uma tristeza enorme, pessoas que querem uma educação de primeira, são poucas e em geral não tem o poder ou influência para mudar toda uma cultura já implantada na cabeça do povo, que acha normal uma escola/ensino caindo aos pedaços.
Ilona, estar pessimista é muito positivo. É a resistência consciente e valente à mediocridade, defendida cinicamente pelos políticos como ponto de passagem do tosco para o evoluído.
O crescimento da tribo dos pessimistas catalisará mudanças. Mesmo que lentamente!