Inovar em educação no Brasil hoje ainda é ensinar o básico…

Uma matéria no Estadão de hoje com o título “Escola inovadora não tem prova ou carteira” dá bem uma ideia da confusão que ainda fazemos ao misturar conceitos como estrutura escolar com cara diferente e inovação, ou até mesmo do que possa ser chamado de inovação em atividades escolares.

A escola como conhecemos hoje, é uma instituição relativamente antiga, para a qual encaminhamos diariamente nossos filhos (o futuro de uma sociedade) de forma que eles aprendam conteúdos, habilidades e comportamentos que consideramos necessários para a vida adulta em comunidade e para seu desenvolvimento econômico, social e político.

Cada vez mais, países desenvolvidos (aqueles que são industrializados, democráticos e cuja população apresenta renda per capita alta segundo a classificação do Banco Mundial) estão descobrindo que se esses conteúdos, habilidades e comportamentos não forem claramente explicitados e monitorados, podem não ser aprendidos. Pelo menos não por todos os indivíduos que deles necessitarão para contribuir positivamente com as perspectivas de futuro dessa sociedade.

Assim, uma das tendências recentes, ou seja, uma das inovações que observamos ao estudar políticas educacionais, é a especificação do que se faz na escola. Daí o debate atual, também no Brasil, sobre a necessidade da existência e, acima de tudo, da qualidade do conteúdo de uma Base Nacional Comum Curricular.

Na verdade, a matéria do Estadão faz referência a uma iniciativa do Governo Federal:  Mapa de Inovação e Criatividade do MEC, que identificou “inovações” segundo os critérios abaixo, para compor o Mapa da Inovação e Criatividade na Educação Básica do MEC:

“I – GESTÃO: Corresponsabilização na construção e gestão do projeto político pedagógico. Estruturação do trabalho da equipe, da organização do espaço, do tempo e do percurso do estudante com base em um sentido compartilhado de educação, que orienta a cultura institucional e os processos de aprendizagem e de tomada de decisão, garantindo-se que os critérios de natureza pedagógica sejam sempre preponderantes.

II – CURRÍCULO: Três aspectos garantem um currículo inovador: 1) Desenvolvimento integral: estruturação de um currículo voltado para a formação integral, que reconhece a multidimensionalidade da experiência humana – afetiva, ética, social, cultural e intelectual; 2) Produção de conhecimento e cultura: estratégias voltadas para tornar a instituição educativa espaço de produção de conhecimento e cultura, que conecta os interesses dos estudantes, os saberes comunitários e os conhecimentos acadêmicos para transformar o contexto socioambiental; 3) Sustentabilidade (social, econômica, ecológica e cultural): estratégias pedagógicas que levem a uma nova forma de relação do ser humano com o contexto planetário.

III – AMBIENTE: Ambiente físico que manifeste a intenção de educação humanizada, potencializadora da criatividade, com os recursos disponíveis para a exploração e a convivência enriquecedora das diferenças. Estratégias que estimulam o diálogo entre os diversos segmentos da comunidade, a mediação de conflitos por pares, o bem-estar de todos, a valorização da diversidade e das diferenças e a promoção da equidade.

IV – MÉTODOS: Protagonismo: Estratégias pedagógicas que reconhecem o estudante como protagonista de sua própria aprendizagem; que reconhecem e permitem ao estudante expressar sua singularidade e desenvolver projetos de seu interesse que impactem a comunidade e que contribuam para a sua futura formação profissional.

V – ARTICULAÇÃO COM OUTROS AGENTES: Rede de direitos: estratégias intersetoriais e em rede, envolvendo a comunidade, para a garantia dos direitos fundamentais dos estudantes, reconhecendo-se que o direito à educação é indissociável dos demais.”

Foram formados Grupos de Trabalho em São Paulo e nos demais estados para:

I – monitorar o desenvolvimento da Iniciativa para Inovação e Criatividade na Educação Básica no estado;

II – debater referências regionais sobre a inovação e criatividade na educação básica;

III – apoiar a divulgação regional das estratégias da Iniciativa para Inovação e Criatividade na Educação Básica;

Vamos ver alguns exemplos aleatórios do que esse grupo selecionou como inovador, ao incluir escolas e instituições de educação no seu “Mapa de Inovação”, em relação ao Estado de São Paulo – 48 escolas entre públicas e privadas:

Escola Estadual Professor José Manoel Álvares Rosende, de Bom Jesus dos Perdões – na qual apenas 35% dos alunos aprendem o esperado em LP e 15% em Matemática no 9º ano

“Vive um processo de mudança para uma educação inovadora e criativa. Mapeou num raio de 1km da escola todos os espaços com potencial educativo, o que está aproximando a escola da comunidade. Em 2016, vai trabalhar com os alunos de forma diferenciada: os matriculados do 6º ao 9º ano serão organizados a partir de roteiros de estudos, podendo, dentro da escola, escolher seu local de estudo, como e com quem o fará. Os professores assumirão o papel de tutor e acompanharão toda a pesquisa e o aprendizado alinhando conteúdos objetivos e subjetivos.” (grifos meus)

Escola Municipal Luiz Barbosa, de Águas de Lindóia – na qual apenas 33% dos alunos aprendem o esperado em LP e 22% em Matemática no 9º ano

 

Possui um plano de ação para inovação. Está elaborando um novo projeto pedagógico que visa construir uma escola democrática e autônoma. Pretende desenvolver uma metodologia que possibilite aos estudantes escolher aquilo que querem aprender, para que, assim, possam se desenvolver com autonomia e responsabilidade.” (grifos meus)

EPG Gianfrancesco Guarnieri, de Guarulhos – na qual apenas 29% dos alunos aprendem o esperado em LP e 9% em Matemática no 9º ano

 

“Praticam uma gestão democrática, em que os alunos têm voz por meio das comissões de alunos, eleitas em cada turma, que escolhe seus conselheiros mirins por meio do voto. Desenvolve projeto denominado Rede de Solidariedade, criado pelos próprios alunos para combater a indisciplina e a ausência de olhar para o outro como um ser humano importante no contexto e respeitado na sua singularidade. Criaram-se crachás com os dizeres “preciso de ajuda” e “posso ajudar”, que estende as relações humanizadoras em se preocupar com o bem estar dos colegas, funcionários, professores no dia a dia. A escola estimula os estudantes que terminam as atividades a ajudar os que apresentam mais dificuldades.”

Escola Municipal de Ensino Fundamental Padre Emílio Miotti, em Campinas  – na qual apenas 59% dos alunos aprendem o esperado em LP e 47% em Matemática no 5º ano

 

O processo de inovação começou em 2013 e é um trabalho permanente. Conselho escolar, pais e funcionários são atuantes e auxiliam na gestão escolar e outros eventos. As assembleias são mensais e têm como pauta a alimentação dos alunos, o uso dos computadores e outros assuntos do cotidiano da escola. O currículo é desenhado com base em ateliês oficinas. Professores se unem para organizar os ateliês, de acordo com os interesses dos alunos, que escolhem um ateliê a cada três meses. Nos ateliês, eles são organizados por interesse e formados grupos que podem agrupar estudante de até quatro séries. A escola tem autonomia para organizar o currículo e valoriza a participação dos alunos, funcionários e familiares. Usa espaços fora da escola para passeios agendados a partir dos projetos, e não por turma.”(grifos meus)

Com indicadores tão ruins em avaliações internacionais, o Brasil ainda precisa ensinar seus alunos a ler e a escrever, além de fazer operações muito elementares de Matemática, como as que são cobradas na Prova Brasil. Inovar fugindo de um currículo estruturado e do monitoramento do aprendizado, aparentemente, não está funcionando para algumas das escolas que entraram no Mapa!

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