Lápis e caneta ou teclado? Depende do uso que se quer dar ao cérebro!
Hoje em dia, com tantos equipamentos eletrônicos à disposição de crianças e adultos e tanta pressão para aumentar a percepção a respeito de sua utilidade, algumas escolas e famílias começam a achar que é uma boa ideia substituir o aprendizado da escrita à mão pelo teclado ou tela do computador. As pesquisas vêm mostrando que não é bem assim, que o cérebro aprende melhor se usarmos a velha e boa caneta não só na hora de aprender a ler e a escrever, mas também quando se toma notas, ao se assistir a uma aula, palestra ou ao ler um livro.
Eis alguns estudos.
“Escrita ou datilografia? A influência do treinamento da escrita com caneta ou com teclado no desempenho de leitura e escrita em crianças pre-escolares.”
Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4710970/
Adv Cogn Psychol. 2015; 11(4): 136–146. Published online 2015 Dec 31.
Dispositivos de escrita digital associados ao uso de computadores, tablet, PCs ou telefones celulares estão cada vez mais substituindo a escrita manual. No entanto, existe uma discussão controversa sobre como os modos de escrita influenciam o desempenho da leitura e escrita em crianças no início da alfabetização. Por um lado, a facilidade de digitação em dispositivos digitais pode acelerar a leitura e a escrita em crianças pequenas, que têm habilidades motoras sensoriais menos desenvolvidas. Por outro lado, a ligação significativa entre ação e percepção durante a escrita manual, que estabelece traços de memória senso-motora, poderia facilitar a aquisição da linguagem escrita. Para decidir entre essas alternativas teóricas, no presente estudo, desenvolvemos um intenso programa de treinamento para pré-escolares que frequentam o jardins de infância na Alemanha com 16 sessões de treinamento. Usando jogos de aprendizagem de letra estreitamente combinados, oito letras do alfabeto alemão foram treinadas por meio da escrita com uma caneta em uma folha de papel ou digitando em um teclado de computador. Foram avaliados o reconhecimento de letras, nomeação e escrita, assim como o desempenho de leitura e escrita de palavras. Os resultados não indicaram uma superioridade do treinamento de digitação sobre o treinamento de escrita manual em nenhuma dessas tarefas. Em contraste, o treinamento de escrita era superior ao treinamento de digitação na escrita de palavras e, como tendência, na leitura de palavras. Os resultados de nosso estudo, portanto, suportam teorias da ligação ação-percepção assumindo uma influência facilitadora de representações senso-motoras estabelecidas durante a escrita manual na leitura e na escrita.
“A influência da prática de escrita no reconhecimento de crianças pre-escolares: uma comparação entre escrita à mão e digitação.”
Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0001691804001167
Acta Psicologia Volume 119, Issue 1, May 2005, Pages 67–79
Um grande número de dados apóia a visão de que o movimento desempenha um papel crucial na representação de letras e sugere que a escrita manual contribui para o reconhecimento visual das letras. Se assim for, alterar as condições motoras enquanto as crianças estão aprendendo a escrever usando um método baseado na digitação ao invés manuscrito deve afetar seu desempenho subsequente no reconhecimento de letras. Para testar essa hipótese, treinamos dois grupos de 38 crianças (3-5 anos) para copiar as letras do alfabeto, escrevendo-as à mão ou digitando-as. Após três semanas de aprendizagem, realizamos dois testes de reconhecimento, com diferença de uma semana entre eles, para comparar os desempenhos de reconhecimento de letras dos dois grupos. Os resultados mostraram que nas crianças mais velhas, o treinamento de escrita manual deu origem a um melhor reconhecimento de letras do que o treinamento por digitação.
“Comparando a memória na escrita manuscrita e na digitação.” (2009)
Disponível em: http://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/154193120905302218
Trata-se de uma investigação sobre as possíveis ligações entre a ação psicomotora em atividades de escrita manual e memória. Uma comparação de recuperação e reconhecimento de palavras comuns demonstra que a memória funciona melhor para palavras quando foram escritas à mão comparadas quando foram digitadas. Isso fornece suporte adicional para a hipótese de que o contexto adicional proporcionado pela complexa tarefa de escrever resulta em melhor memória. Com a recente tendência para se fazer anotações em formato eletrônicas, as implicações educacionais e práticas desses achados sugerem que o desempenho pode ser melhorado usando notas tradicionais de papel e caneta.
“Aprendizagem por meio de escrita à mão ou digitalização influencia o reconhcecimento visual de novas formas gráficas: evidências de imagens comportamentais e funcionais”
Disponível em: http://www.mitpressjournals.org/doi/abs/10.1162/jocn.2008.20504#.WOJX-IgrJPY
Journal of Cognitive Neuroscience, May 2008, Vol. 20, No. 5 , Pages: 802-815
O reconhecimento visual rápido e preciso de caracteres únicos é crucial para a leitura eficiente. Exploramos a possível contribuição memória da escrita nos processos de reconhecimento de caracteres. Avaliamos a habilidade dos adultos de diferenciar novos caracteres das suas imagens espelhadas, depois de terem aprendido como produzi-los, por escrita tradicional em caneta em papel, ou por teclado de computador. Após o treinamento, encontramos uma facilitação mais forte e duradoura (várias semanas) em reconhecer a orientação dos caracteres que haviam sido escritos à mão em comparação com aqueles datilografados. As gravações de imagem de ressonância magnética funcional indicaram que o modo de resposta durante o aprendizado está associado com vias distintas durante o reconhecimento de formas gráficas. Observou-se maior atividade relacionada ao aprendizado de escrita manual e identificação de letras normais em diversas regiões cerebrais conhecidas por estarem envolvidas na execução, formação de imagens e observação de ações, em particular, a área de Broca esquerda e lóbulos parietais inferiores bilaterais. Em conjunto, esses resultados fornecem fortes argumentos a favor da visão de que os movimentos específicos memorizados ao aprender a escrever participam do reconhecimento visual de formas e letras gráficas.